Projeto de lei nasceu com o objetivo de destravar o potencial da modalidade de energia eólica no país, mas teve seu conteúdo descaracterizado com a inclusão de dispositivos na tramitação na Câmara dos Deputados. 3o6k5c
A poucos dias da sessão do Congresso Nacional marcada para o próximo dia 27 de maio, entidades do setor elétrico intensificam uma ofensiva junto a parlamentares para tentar derrubar os vetos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a trechos polêmicos do Projeto de Lei nº 576/2021, que regulamenta a geração de energia eólica em alto-mar (offshore) no Brasil.
No centro da disputa estão os artigos 22, 23 e 24, vetados por Lula, por tratarem de temas estranhos ao objetivo principal do projeto — os chamados “jabutis”. O PL nasceu com o objetivo de destravar o potencial da energia eólica no mar no país, mas teve seu conteúdo descaracterizado na tramitação na Câmara dos Deputados.
Foram incluídos dispositivos que impõem a contratação obrigatória de usinas térmicas a gás natural com operação mínima de 70% do tempo (inflexíveis), a prorrogação de contratos de usinas a carvão mineral, a aquisição compulsória de energia de pequenas centrais hidrelétricas (PCHs), independentemente de haver demanda efetiva do mercado, postergação de prazos benefícios a projetos da geração distribuída, entre outros.
Um estudo da consultoria PSR estima que a manutenção dos artigos vetados pode gerar um impacto de R$ 545 bilhões nas contas de luz dos brasileiros até 2050 — o equivalente a um aumento médio de 9% nas tarifas.
“Além dos impactos tarifários diretos na conta de luz, os jabutis desarranjam completamente o setor. Afetam a demanda de futuros leilões, aumentam os cortes de geração, impactam preços de energia no mercado livre e produzem um dano institucional, além de prejudicar o planejamento energético. Por último, os jabutis eliminam o já pequeno espaço tarifário para remunerar os investimentos certos, como aqueles necessários para adaptação às mudanças climáticas”, disse o CEO da PSR, Luiz Barroso.
Luiz Eduardo Barata, presidente da Frente Nacional dos Consumidores de Energia, reforça o alerta e acrescenta que os artigos estranhos inviabilizam proposta atual de reforma do setor elétrico de baratear a conta de luz.
“Se o Congresso derrubar o veto, os consumidores terão alta imediata na conta de luz e o marco legal das eólicas offshore, que deveria estimular a transição energética, ará a financiar geração suja e cara”, afirma.
A Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg) até lançou uma campanha nacional em defesa da manutenção dos vetos presidenciais. Segundo a entidade, o uso de termelétricas eleva a inflação e compromete toda a cadeia produtiva: pão mais caro (+4%), cesta básica mais pesada (+6%), conta de luz com alta de até 20% e aumento de 9% nos custos da indústria.
Nesta mesma linha, a Abradee, associação das distribuidoras de energia, disse que os jabutis vetados da lei das eólicas offshore teriam um impacto no orçamento das famílias que somaria 0,35 pontos percentuais a cada mês no índice oficial de inflação.
Contra-ataque do Planalto
Ciente da pressão, o Palácio do Planalto mobilizou uma operação política para tentar manter os vetos presidenciais. A avaliação é de que ceder aos interesses de grupos econômicos comprometeria a credibilidade do governo nas pautas ambientais, além de aumentar os custos da energia para a população.
Se a derrubada dos vetos for confirmada, o país poderá ter um marco da energia eólica offshore que, paradoxalmente, favorece térmicas a carvão e gás, eleva as tarifas e joga contra o próprio futuro da energia limpa no Brasil.
A Abegás, ligada a empresas de distribuição de gás, diz que é favorável que o Congresso mantenha as usinas termelétricas a gás natural no texto do PL, porque isso viabiliza a expansão da infraestrutura e interiorização do gás natural no País, além do que essas usinas “darão previsibilidade ao despacho reduzindo a conta de
luz para todos consumidores, cativos e livres, residências e indústrias”.
O setor eólico, responsável pelo PL, reage: “Onde já se viu o legislativo decidir qual a fonte o consumidor vai usar, onde será produzida e quanto vai custar. Quem deveria fazer isso é o planejador, a Empresa de Pesquisas Energéticas (EPE) e o Ministério de Minas e Energia (MME) como poder concedente”, diz Marcello Cabral, diretor de Novos Negócios da Abeeólica.
O segmento eólico é o mais interessado, mas vê no PL que viabiliza a criação de um marco legal para desenvolvimento do setor, o oportunismo de setores pegando carona, sem a responsabilidade do custo que isso impõe à sociedade.
A Abrapch, associação que representa as pequenas centrais hidrelétricas, também tem apostado no diálogo com os parlamentares pela derrubada dos vetos. A presidente da entidade, Alessandra Torres, classifica a articulação como um “lobby do bem”, argumentando que há desinformação sobre o tema e que existem estudos que embasam os dispositivos defendidos pelo setor que ela representa.
“Não é porque é um projeto de eólicas offshore que não podemos tratar de outros assuntos. É normal e acontece ao longo dos anos”, diz Torres. “Trocar 8 GW da lei da privatização da Eletrobras acrescenta.
por 4,5 GW de PCHs é muito vantajoso ao consumidor”, Apesar da roupagem verde, os dispositivos vetados poderiam ampliar em até 25% as emissões de gases de efeito estufa no país, conforme projeções de especialistas.
No caso do setor de carvão, os artigos pedem a prorrogação de contratos de usinas no Sul do Brasil até 2025. A polêmica expõe um dilema ESG: deputados tentam viabilizar as usinas sob o argumento de manter os 36 mil empresas empregos em Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
Por outro lado, especialistas dizem que a proposta contradiz os compromissos ambientais assumidos pelo Brasil às vésperas da COP 30. O presidente da ABCS, Luiz Fernando Zancan, que representa as empresas ligadas à cadeia do carvão, diz que a manutenção das usinas representa a segurança do sistema.
“No apagão de 2023, foram essas máquinas a carvão que permitiram que o Sul do Brasil tivesse apenas 15 minutos de apagão, enquanto que o Nordeste ficou cerca de cinco horas. sem essas máquinas girantes geram inércia, energia, potência e serviços auxiliares temos problemas”, frisa.
Imagem e Conteúdo por Valor Econômico.
https://valor.globo.com/brasil/noticia/2025/05/12/lobby-se-intensifica-no-congresso-para-derrubar-vetos-aos-jabutis-das-eolicas-em-alto-mar.ghtml
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